Obstetra já foi condenada pelo crime de recusa de médico, em 2010. Unidade Local de Saúde do Nordeste, médica e seguradora condenados a pagar indemnização de 385 mil euros. Recurso da médica trava o processo e já lá vão dois anos. Pais sem apoios para suportar custos avultados.
Gonçalo Damasceno, o rapaz que nasceu, na maternidade de Mirandela, com uma incapacidade de 95 por cento, completou, ontem, 17 anos, praticamente o tempo que os seus pais lutam na barra dos tribunais para que seja feita justiça.
“É um sentimento de revolta e de injustiça. Acho isto incompreensível”, lamenta Isabel Bragada, a mãe, que aguarda, há dois anos, pela decisão do recurso apresentado pela médica obstetra, que foi condenada, em conjunto a sua seguradora e a Unidade Local de Saúde do Nordeste (ULSNE) ao pagamento de uma indemnização de 385 mil euros., por danos morais e patrimoniais, para além de terem de custear as obras de adaptação no apartamento.
O caso remonta a 11 de Fevereiro de 2003, quando Isabel deu entrada, na maternidade do hospital de Mirandela, com 39 semanas de gestação. A médica obstetra decidiu que iria provocar o parto e propôs o internamento.
Apesar de estar em regime de presença física, ausentou-se do hospital. O feto veio a ficar encravado, provocando dificuldades respiratórias e falta de oxigenação do sangue.
A médica foi novamente contactada e teve de socorrer-se de ventosa, mas o bebé viria a nascer com paralisia cerebral e epilepsia.
O Gonçalo ficou sem qualquer mobilidade, não fala, alimenta-se através de uma sonda no estômago, é ventilado durante a noite.
Em 2010, o Tribunal de Mirandela condenou a obstetra a 3 anos de prisão, com pena suspensa, pelo crime de recusa de médico. Pena que foi confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto, em fevereiro de 2012, altura em que os pais dão entrada com um pedido de indemnização, que teve a sentença em 2018.
A ULSNE e a seguradora acataram a decisão, mas a médica recorreu para o Tribunal Central Administrativo do Porto, suspendendo a aplicação do acórdão.
Devido ao agravamento do quadro clínico, há cerca de dois anos que o Gonçalo está de uma forma permanente no Kastelo, a única unidade de cuidados continuados e paliativos pediátricos de Portugal, situada em São Mamede de Infesta, a 140 quilómetros de Mirandela. “A vantagem é o bem-estar da saúde dele, mas em termos emocionais, a distância acarreta muita angústia, porque sentimos a necessidade de estar com ele, mas não podemos porque está longe”, diz Isabel lembrando os custos com esta situação. “Financeiramente é brutal, porque não temos a ajuda de ninguém. Só nestes dois anos, os encargos superam os 20 mil euros, sem contar com as fraldas, os medicamentos e os cremes, que tanto agradecíamos que alguma empresa nos pudesse ajudar com esse material”, apela.
Isabel conta que esta luta pela justiça tem tido consequências elevadas para a família. “Ao longo destes anos, tivemos de pagar todas as custas judiciais, porque temos de acompanhar os recursos, e os honorários para os advogados”, lembra.
Jornalista: Fernando Pires