Artigo de opinião escrito por Alzira Lages – Professora
A situação que se vive, no momento, no seio da comunidade de professores deixa-me apreensiva, irritada e desiludida enquanto cidadã deste país, membro ativo desta sociedade descontente e profissional qualificada num grupo específico de pessoas que têm a responsabilidade de instruir e de ajudar a formar consciências dos futuros membros ativos da nossa sociedade.
Sou professora e pertenço à comunidade educativa que está, presentemente, em agonia com a situação que estamos a viver, derivada das variadas injustiças que nos afetam diretamente tais como o processo de colocações em curso, a contagem de tempo, descongelamento de escalões e outras. Familiares e amigos estão a ver e a sentir as nossas vidas desmoronarem-se por causa da falta de ética, de justiça e de coerência de um processo onde fatores importantes como a idade ou a antiguidade não estão a ser considerados e respeitados.
Num país onde o pilar social assenta na família e na sua estrutura coesa, não aceito que os casais continuem a ser separados, os filhos deixados para trás e as demais clivagens familiares e sociais estejam a acontecer com professores com mais de 25 anos de ensino e de 50 anos de idade. Não aceito nem compreendo como é possível que eu com 54 anos de idade e 28 anos de serviço, ainda tenha que continuar com o “saco às costas” de escola em escola, de concelho em concelho por esse país fora, sem qualquer perspetiva de estabilidade e sem qualquer horizonte.
Será que os professores são pessoas sem direito a uma vida digna? Serão uma classe sem direito a uma perspetiva de vida familiar e a um equilíbrio emocional duradouro? Porque se continua a negar a esta classe um horizonte de estabilidade profissional, familiar e social? Porque temos que ouvir uma criança dizer à sua mãe professora que se sente traída nos sentimentos, abandonada e que afinal a mãe não gosta dela quando a progenitora lhe disse que vai ter que ir dar aulas para outra escola longe? Como pode o conceito de família ser sustentável neste contexto, o que inclui os baixos salários na educação, potenciando de forma ainda mais negativa estas situações inopinadas e descontextualizadas? Para que serve então a idade, o tempo de serviço e a hierarquização em listas nacionais de antiguidades?
Quero dizer-vos que fico triste, desagradada e desmotivada com o que está a acontecer na educação. Sou uma defensora da ideia de que um país sem justiça e sem educação não pode progredir e avançar de forma positiva rumo ao futuro.
Pois são precisamente estes dois pilares fundamentais que começam a fissurar e a falhar no suporte deste país que, embora pequeno na sua dimensão, já foi grande e que agora se aproxima rapidamente de um país de terceiro mundo com tiques de modernidade.
Quero referir em particular as questões pessoais. Como resultado de tudo isto surgem as situações intrínsecas a cada um de nós que vive esta instabilidade. As capacidades de cada um e a forma como encaram os problemas são diferentes. A desmotivação, as doenças físicas e psicológicas não aparecem por acaso.
A tristeza do dia a dia, a lágrima no canto do olho quando se sai de casa com o carro cheio de “tralha” para mais uma semana, uma quinzena ou algo mais (e quem tem o privilégio de poder usar o carro), não tem forma de pagamento.
É demasiada dor na hora da partida, é demasiada saudade no dia a dia, é enorme a preocupação com a vida e são trágicos, por vezes… demasiadas vezes, os resultados de tudo isto. É difícil perceber, é impossível aceitar, é demasiado duro viver esta profissão nestas circunstâncias. Por isso tantos desistem dela por não aguentarem o sofrimento e quererem ter a tranquilidade por companhia.
Depois de tudo isto, ainda há os pais e educadores. Também eles querem estabilidade para os seus filhos ou educandos. A muita pressão sobre nós e todo este frenesim afeta de uma forma muito negativa e por muitos anos a sociedade em geral. Os professores têm-semostrado descontentes com o regime de mobilidade, provavelmente porque é mobilidade a mais. Não tem sentido o que está a acontecer na maioria das escolas com as trocas constantes de professores, ou a falta deles. Todos ficamos a perder com esta situação e os prejuízos a todos os níveis vão ser profundos e duradouros.
Espero, pois ainda tenho uma réstia de esperança, como cidadã, professora e pessoa ainda empenhada em ajudar a construir um país melhor, que quem gere estes processos, por nossa escolha, olhe para esta situação da colocação dos professores, tempos de serviço e descongelamentos com olhos de ver e use os critérios de justiça ao seu dispor tais como a idade e tempo de serviço, para o bem da nação, da democracia, desta classe profissional, da produtividade educativa, mas, essencialmente, do pilar social que é a família.