Artigo de opinião escrito por Isabel Ferreira ex-secretária de estado do Desenvolvimento Regional, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS e deputada à Assembleia da República pelo círculo eleitoral de Bragança.

A valorização dos territórios do Interior não se faz só recorrendo a fundos europeus, devendo mobilizar fontes de financiamento diferenciadas de acordo com uma estratégia definida. O Programa de Valorização do Interior descreve essa estratégia com base em medidas específicas que não podem, a bem do desafio demográfico, ser interrompidas.

Os orçamentos de estado da governação PS contemplavam propostas para o Interior designadamente benefícios fiscais para pessoas e empresas, que foram sendo sucessivamente reforçados, ou programas específicos como o Trabalhar no Interior.

O atual governo não tem dedicado a atenção que o interior precisa. Ora vejamos alguns exemplos:

  1. Não fora a proposta do PS de eliminar as portagens e nada haveria para o Interior no Orçamento de Estado. Pior, a proposta de redução de IRC indiferenciadamente para as empresas de todo o país, diminui a atratividade dos benefícios fiscais para empresas que se localizem no Interior.
  2. Não fossem as ligações rodoviárias inscritas no PRR pelo anterior governo, incluindo as ligações Bragança-Puebla de Sanabria e Bragança-Vinhais (é muito importante que haja vontade e capacidade para a sua concretização), estes territórios seriam esquecidos no que toca a infraestruturas/projetos anunciados (novo aeroporto, terceira travessia sobre o Tejo, alta velocidade Lisboa-Madrid ou o grande projeto de Coesão Territorial anunciado pelo Sr. Primeiro Ministro no congresso do PSD, destinado à Área Metropolitana de Lisboa, em particular abrangendo o Arco Ribeirinho do Sul).
  3. Foi anunciado que, pela primeira vez, a ligação ferroviária a Espanha via Trás-os-Montes foi discutida numa cimeira ibérica. Congratulando-me com este facto, temos que ser justos e reconhecer ao governo anterior a inclusão no Plano Ferroviário Nacional (PFN) da linha de Trás-os-Montes, com ligação a Vila Real e Bragança, apontando para a ligação a Espanha. Devemos também reconhecer o trabalho dos ex-deputados Sobrinho Teixeira e Berta Nunes nesta matéria que tinham conseguido o compromisso do anterior governo de levar este assunto à Cimeira Luso-Espanhola que decorreu já sob a atual governação. Mas o governo deve ser realista e concentrar-se na Resolução da Assembleia da República nº 98/2024, concretizando a linha de Trás-os-Montes: Porto-Vila Real-Bragança-fronteira.
  4. Não conseguiram encontrar uma solução que evitasse a interrupção da ligação aérea Bragança-Cascais-Portimão, determinante para a Coesão Territorial, ainda mais comparativamente aos benefícios associados aos passes sociais das áreas metropolitanas ou ao passe verde ferroviário que de nada servem aos brigantinos que não dispõem nem de ferrovia, nem de redes de transporte adaptadas à utilização desses passes. Governar é priorizar e encontrar soluções, mesmo quando o problema, ou parte dele, possa ser imputado a governos anteriores. Sabe-se também que este território, como muitos outros do Interior, foram excluídos dos apoios aos autocarros elétricos.
  5. Na área da Educação e Ciência é preocupante o efeito que poderá ter, no Instituto Politécnico de Bragança em particular, o corte no financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia, I.P., ou as menções ao aumento da flexibilidade da gestão das vagas de acesso ao ensino superior e à reorganização desta rede.
  6. Na Saúde, nada previsto para a fixação de médicos no Interior, mesmo tendo havido a promessa de médicos de família para todos no prazo de um ano. O que temos assistido é um agravamento e retrocesso nas políticas de apoio ao SNS e com problemas graves nos serviços de emergência médica que afetaram o nosso distrito.

Reduzir os instrumentos de valorização do Interior a majorações de 20 pp nos sistemas de incentivo à competitividade empresarial (que constava já das majorações definidas no âmbito de políticas setoriais ou territoriais previstas na Portaria nº 103-A/2023) e a 40% do PT2030 é manifestamente insuficiente, para além de não trazer novidade. As empresas do interior contam com diversas majorações (prioridades de políticas setoriais ou territoriais; criação de emprego qualificado; capitalização PME; qualificação da gestão) que as podem fazer atingir a taxa máxima de financiamento. Assim, mais importante do que qualquer majoração é continuar com a política de avisos dedicados para o Interior, com dotação financeira reservada.

Já lá vão mais de sete meses de governação da Aliança Democrática e nada sabemos do Programa de Valorização do Interior. Em menos do que isso, o governo anterior reviu o programa, realizou um concelho de ministros em Bragança dedicado a esta temática, lançou o guia fiscal do Interior e avisos dedicados para as empresas e entidades do sistema científico e tecnológico destes territórios, e criou novos programas de coesão territorial como o +CO3SO Emprego ou o Trabalhar no Interior que chegaram a várias famílias e empresas de todo o Interior e, em particular, do distrito de Bragança.  

O equilíbrio regional e nacional depende destes territórios, pelo que a valorização do interior é um tema que nos deve mobilizar a todos.

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