Caso remonta a 2020, mas só agora, os oito filhos do paciente avançam para a justiça acusando o hospital e o médico de homicídio por negligencia.
Manuel Dias, um pedreiro de 67 anos, tinha graves problemas de saúde, tendo sido operado em 2008 às cordas vocais, no IPO do Porto.
Como se fosse pouco, viu ser-lhe diagnosticada doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), e prova disso eram frequentes as crises de dispneia (falta de ar), com que se foi habituando a viver.
Mas o quadro mudou, para pior, a partir de 6 de janeiro de 2020. Nessa manhã uma filha teve de o conduzir às urgências do hospital de Mirandela onde foi visto por médico. O paciente contou o que sentia e pô-lo ao corrente do seu vasto historial clínico. Mas o médico não terá sido muito sensível, “limitou-se” a um exame radiológico e mandou-o para casa. A filha de Manuel procurou o clínico e pediu “explicações” para a alta. Disse que “como o seu pai, eu tenho cá outros vinte pacientes, portanto não posso fazer mais ao seu pai”.
Embora desagradada com a resposta, a mulher regressou a casa com o pai. Na manhã seguinte, e porque Manuel piorava “a olhos vistos”, tendo chegado a desmaiar com a falta de ar, foi uma neta, Jéssica, quem correu com o avô ao hospital. Voltou a ser atendido pelo mesmo médico que, recordando o quadro clínico de Manuel, no dia anterior, determinou a realização de novo exame radiográfico, após o que terá concluído que o doente se encontrava “sem anormalidades”. Receitou-lhe “vapores” e deu-lhe alta. Inconformada, a neta abordou o médico, tendo insistido para que olhasse para o registo clínico do avô e que o internasse na pneumologia.
Os “vapores” não fizeram efeito e, na manhã seguinte, os familiares voltaram com ele às urgências. Desta vez “com mais sorte, porque o médico era outro”. Triado, foi mandado imediatamente fazer uma TAC cujo resultado revelou uma forte pneumonia “e com muito líquido nos pulmões”. Uma outra médica disse a Andreia Dias que o pai estava tão mal que não sabia se ainda iam a tempo de fazer alguma coisa. Manuel foi de urgência transferido para os Cuidados Intensivos do Hospital de Bragança, onde veio a falecer, um mês e meio depois.
Queixa em tribunal
Este caso, com fim trágico, aconteceu no princípio de 2020, mas só agora é que foi feita a participação ao DIAP de Bragança, por “homicídio por negligência”. Andreia Dias explica que a família nunca aceitou o trágico desfecho. E rapidamente contrataram os serviços de Filipe Guimarães, advogado com escritório no Porto, mas natural de Mirandela.
O causídico “não poupou esforços”, diz Andreia, “para nos ajudar a que se faça justiça”, mas foi travado pelo Covid. O advogado, com a colaboração da equipa do seu escritório, ter-se-á empenhado para responder ao apelo da família sua conterrânea. No entanto, a pandemia atrasou todo o processo. O país esteve parado muitos meses, o que dificultou “enormemente” o trabalho de Filipe Guimarães e da sua equipa.
Só agora, recolhidos todos os elementos que reputam “suprema importância”, é que foi feita a participação criminal. Entende Filipe Guimarães ter reunido prova bastante para se concluir que houve, por parte do médico e do Hospital, “violação de normas de cuidado”, “comportamentos imprudentes e descuidados” que resultaram na morte do paciente. O caso passa agora para as mãos da Justiça.
Tentamos obter uma reação junto da administração da Unidade Local de Saúde do Nordeste (que gere os hospitais e centros de saúde do distrito de Bragança), mas até ao momento não deu qualquer resposta. Já o médico visado na queixa diz apenas não ter sido notificado de nenhuma acusação até ao momento, pelo que não se disponibilizou para falar sobre o caso.
Jornalista: Fernando Pires