Na vila de Carrazeda de Ansiães o ponto mais alto do Carnaval é o rebentamento do “Pai da Fartura”, um evento que usa a sátira social para “expurgar” o descontentamento da comunidade, que culmina com o julgamento e condenação, com pena de morte do “Pai da Fartura”, cujo rebentamento encerra os tempos de folia.
De ano para ano o Carnaval de Carrazeda de Ansiães conquista mais entusiastas, não apenas da terra, mas essencialmente de fora, que se deslocam a este concelho propositadamente para assistir a esta peculiar tradição.
“A sátira social é usada para apresentar publicamente os motivos de insatisfação e discórdia da comunidade, incidindo com muita frequência nas políticas, locais, nacionais ou europeias que, direta ou indiretamente, prejudicam ou penalizam a população” informa autarquia de Carrazeda de Ansiães em comunicado enviado ao Canal N.
A festa começa ao início da tarde do dia de Carnaval, este ano 13 de fevereiro, numa merenda coletiva, seguindo-se o cortejo carnavalesco onde participam mais de 20 tratores com atrelados transformados em carros alegóricos, aos quais se juntam os Zíngaros e outras associações locais com gigantones, cabeçudos e músicos.
“Os carros representam aldeias ou associações locais, que aproveitam o desfile pela sede de concelho para ironizar com a atualidade política económica e social, cada qual sublinhando o que considera mais caricato, descabido ou prejudicial. “Como é Carnaval ninguém leva a mal”, as mensagens vão passando e as alfinetadas deixadas, sem dó nem piedade.
Mas é ao início da noite que o espetáculo “aquece”.” explica o mesmo comunicado.
O povo arrasta o “Pai da Fartura”, a figura alegórica que representa os excessos, as mentiras e enganos, para um julgamento, junto ao Pelourinho da vila. Versos satíricos são lidos a alta voz, provocando riso e aplausos na comunidade, que acorre em massa para assistir ao evento.
Depressa se percebe que as lamúrias do “Pai da Fartura” de nada lhe valeram, a sentença já está (antecipadamente) decidida: pena de morte. A figura é envolta em explosivos, estoira, arde e desfaz-se em cinzas.
Apesar de se tratar de uma festa pagã, por vezes até com pitadas satânicas, este momento representa o fim de um ciclo, de fartura e de folia, e o início do período de Quaresma que, seguindo a religião católica, representa sacrifícios, jejum, abstinência, recolhimento e oração.
Jornalista: Lara Torrado