Artigo de opinião de Elói Gouveia Santos – Responsável de Comunicação Empresa Pública Municipal
O título da crónica quase que era o título de um maravilhoso romance de Umberto Eco. No entanto, não se trata do que seria uma mais que merecida crítica literária. Falta-me o engenho e, desta vez, também a vontade.
José Afonso cantou um poema de Fernando Pessoa, cheio de vazio. Tão cheio que transborda. Sim, o nada ocupa demasiado espaço. Diria até que os nadas ocupam demasiado tempo. ” No comboio descendente ia tudo à gargalhada, uns por verem rir os outros, outros sem ser por nada.”
Vamos somando semanas de segunda a domingo como se fôssemos crianças a repetir uma palavra muitas vezes, tantas, que acaba por perder o significado.
Não estou certo de que esta seja um pensamento partilhável, ou sequer interessante para quem o leia. E peço desculpa por isso.
Tudo neste tempo parece apontar para a dúvida. Não sei, também, em que momento nasce uma amizade. Não se decreta e portanto é difícil perceber quando aparece.
Falecer, desaparecer, desvanecer: são palavras que soam a “poucochinho” na altura de significarem aquilo que deveriam. Não são sequer capazes de ser um eufemismo que anestesie. As pessoas morrem. E isso é um soco no estômago. Toda a gente do Norte sabe que um “caramba” não substitui um “f*da-se”, e que há alturas em que só um deles pode ser aplicado.
A Rosa é (sim, é!) uma amiga que morreu. Assim, sem mais. De um dia para o outro, sem avisar. E a ausência fica, sentada naquela cadeira que nos lembra, lembrará sempre, daquele sorriso. Aquela cadeira não tem de ser uma cartografia de dor, não…
Não adianta rebelarmo-nos contra a morte. Ela não conhece as intermitências em que Saramago tão brilhantemente nos pôs a pensar. Mas afinal qual é o papel da morte? Avisa-nos, constantemente, do valor da vida.
E nós, no meio da azáfama, temos dificuldade em perceber o quão definitiva é a sentença. Quem me conhece sabe que não sou pessoa de expressar sentimentos. Mas há horas para tudo. E eu gosto da Rosa, do João, do José, da Cristina, da Mariana, da Raquel, da Marta, do Ricardo, e de tantos outros. Só agora resolves anunciar?, pergunto a mim mesmo, seguro de que (quase) nada deve ficar por dizer.
Coloquemos as coisas em perspetiva. Quase nada é urgente, quase nada é emergência. Só a vida. Vivê-la o melhor que pudermos, desvalorizando o que é de desvalorizar, é um desígnio. A felicidade é um imperativo e talvez devesse ser ensinada nas escolas. Claro que, como cantam os Clã, feliz a 100% só um pateta feliz. Russel, advoga que o aborrecimento é essencial para que possamos ser felizes. Não sei, uma vez mais, não sei.
Se me permitem, recorro a gente muito mais capaz, de dizer aquilo que eu gostaria de saber dizer. Mas não sei, novamente.
Eugénio de Andrade, tal e qual um engenheiro, sabe construir/desconstruir e deixar tudo no (in)devido lugar.
Faço minhas, mas tuas, porque são para ti, estas palavras:
É URGENTE O AMOR
É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.”