Artigo de opinião escrito por Bruna Costa – estudante de Ensino de Português na Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
A vida de um voluntário não é fácil. Somos aqueles que representam uma mísera ínfima parte de uma população, que se prontifica de braços abertos e sorriso rasgado a abraçar a causa (seja ela qual for), na ingénua esperança de contribuir para um mundo um pouco melhor do que aquele que conhecemos.
Somos aqueles que chegam ao final do dia, depois de olhares desaprovados, caras de enjoo, respostas tortas com uma pitada de desdém, mas que pensam “valeu a pena”. Bom, a verdade é que todo aquele que sabe e vive a experiência, chega a um momento em que os últimos neurónios de boa simpatia estão prestes a acabar e a única solução é combater a crise psicótica com a criação de todo um cenário satírico das cenas vividas. Todo o voluntário chega a criar piadas e diálogos consigo mesmo, na tentativa de preservar a sua boa intenção e sentir que pelo menos pode retirar algumas gargalhadas de tudo aquilo, afinal, por vezes rir é o melhor remédio!
E como é bom rir da senhora do nariz empinado que desconhece as boas maneiras básicas de um simples “bom dia” ou “boa tarde” (sim, porque também existem pessoas mal-humoradas de tarde. Deixei de acreditar que poderia ser apenas um efeito consequente, do chamado “mau humor matinal”, mas estava enganada). Para além disso, não há postura mais autoritária do que um voluntário. É uma sensação de imponência inexplicável, quando muitas pessoas passam por ti e têm medo de te encarar. – “Um simples olhar poderá deitar tudo a perder” – pensam elas. Então, preferem seguir em frente, sem desviar o olhar ou manter a postura o mais firme possível (juro que por vezes dão a sensação que estremecem ao passar por nós).
Ou então, aquela típica pessoa que pergunta qual é a causa, e se lhe dizemos “causa animal”, respondem imediatamente com desdém e a típica narrativa de: “tantas pessoas a precisar de ajuda”. Ou então, quando dizemos que a causa se aplica a pessoas: “não confio muito para onde realmente vão esses donativos”. Enfim, ambos sabemos que aquele senhor, ou senhora que querem saber tudo e nada dão, só queriam mesmo cinco minutos de fama para criticar qualquer coisa, independente do que for dito. E que, passem por um cão esfomeado ou por uma pessoa necessitada, mais rápido desviam a cara do que quando passam por um voluntário como eu.
A vida de voluntário não é fácil! Por vezes temos situações caricatas de pessoas que nada contribuem e esperam ser ajudadas por nós: “E a mim quem me ajuda?” Ou então, aquele senhor distraído que, em vez de dar alguma contribuição, uma vez que vai perdido nos seus pensamentos, confunde a nossa banca com um ponto de venda do supermercado. (Acreditem, já aconteceu mais vezes do que possam imaginar). Mas nesses casos, conseguimos retirar alguns sorrisos de embaraço e uma expressão de “continuem o vosso trabalho”- e segue o seu caminho.
Pior mesmo, são os momentos de desilusão daqueles que nos iludem, brincam com o coração de um voluntário e, em seguida, espezinham-no no chão, sem dó nem piedade, e seguem caminho, sem nunca olhar para trás. Refiro-me ao típico discurso de “ah sim, quando voltarmos contribuímos com qualquer coisa!”, mas ambos sabemos, tu e eu, que eles não vão voltar.
A vida de um voluntário não é fácil! Mas é recompensador. Acreditem ou não, mesmo depois de todos os episódios que nos fazem chegar à beira da loucura e da desistência pela humanidade, há sempre um sorriso rasgado em retorno ao teu, uma palavra de incentivo que levanta o espírito, ou mesmo aqueles que não nada dão, olham para ti, como pessoa que és (porque nós também somos pessoas), agradecem pelas tuas palavras, são honestas e seguem as suas vidas. Essas pessoas são aquelas pelas quais vale a pena ainda acreditar na humanidade e na esperança por um mundo melhor.
A vida de voluntário não é fácil, mas nós nunca nos contentaremos com coisas fácies. Está-nos no sangue.