Artigo de opinião escrito por Agostinho Beça – Deputado Municipal

A respeito da proposta de localização em Mirandela da sede do novo Instituto Público denominado Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, I.P. (CCDRN), que foi criado pelo Decreto-Lei n.º 36/2023, de 26 de maio, apresenta-se a opinião expressa na 3.ª Sessão Ordinária da Assembleia Municipal de Mirandela pelo Grupo do Partido Socialista, no passado dia 30 de junho de 2023, devidamente adaptada à circunstância desta publicação e completada com mais algumas considerações, tidas como oportunas e pertinentes para melhor compreensão da matéria. A intervenção na íntegra encontra-se disponível aqui.

«Vejamos, desde já, que não há político nenhum que não lamente o despovoamento do interior e que não defenda a adoção de medidas para inverter o processo…!

Esta poderá ser uma dessas grandes medidas!!!

Aquilo que podia parecer uma ideia “peregrina” há uns tempos atrás, afinal, parece que já ganhou corpo e granjeou apoios…

Notícias recentes dizem-nos que a Presidente da Câmara de Mirandela “ganhou uma aliada na sua reivindicação…” – nada mais nada menos que a Sr.ª Secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, Professora Isabel Ferreira, que se pronunciou advertindo que a decisão deverá ser consensual na Região…

Afigura-se ter já sido plenamente assumido que a integração da Direção Regional de Agricultura neste Instituto Público é um processo irreversível e, nesse sentido, temos de entender e aceitar as dinâmicas e transformações organizacionais nos Serviços periféricos da Administração…

A Direção Regional de Agricultura existe em Mirandela desde finais do séc. XIX, com outras designações, outra missão e outras competências e atribuições, conforme os contextos temporais.

As organizações não são imutáveis e seria impensável, nos dias de hoje, imaginar este Serviço de Agricultura ainda com a vestimenta de “Estação de Sericicultura”, em 1886, do tempo do seu criador, o agrónomo de Abreiro, João Inácio Teixeira de Meneses Pimentel, ou de “Brigada Técnica da III Região Agrária”, como se designava até à criação da Direção Regional de Agricultura de Trásos-Montes (DRATM), em 1976.

E o que menos nos deve preocupar, neste momento, é que o novo organismo seja um Instituto Público. Muitos dos Serviços do Estado, no seu papel regulador e fiscalizador, funcionam sob essa figura e resultaram da fusão de uma ou mais organizações estatais, p.ex.: Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, IP; Agência Portuguesa do Ambiente, IP; Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP e muitos mais…

Até porque “os institutos públicos são entes autónomos do Estado e, por isso, dispõem de personalidade jurídica, ou seja, são pessoas coletivas com autonomia administrativa e financeira, capacidade negocial, património próprio, etc.”, o que não acontecia com a Direção Regional de Agricultura.

Por outro lado, contrariando algumas afirmações recentemente proferidas por alguns “fazedores de opinião” que, com pensamentos redutores e miserabilistas, apoucavam a ex-Direção Regional de Agricultura, cumpre esclarecer que, além de muitas mais competências do que as que referiram, esta organização tem, ainda hoje, nos seus quadros, quase 600 trabalhadores, distribuídos por oito distritos do território da sua área de atuação, que – lembro – são todos os concelhos situados a norte do Douro e mais alguns da margem sul, integrados na Região Demarcada…

Passamos a explicar melhor: no Distrito de Bragança tem 158 trabalhadores (o que inclui 110 em Mirandela); no de Vila Real – 127; Braga – 122; Porto – 118; Viana do Castelo – 34; Viseu – 19; e na Guarda – 5 | TOTAL – 593.

Ora, se estes 593 trabalhadores irão integrar os mapas de pessoal da extinta CCDRN, que tem pouco mais de 200 trabalhadores, quase todos concentrados no Porto, é caso para questionar quem é que “absorve” quem…!?, ou melhor, qual é o organismo que é integrado e qual é o que integra…!?

O período de 60 dias úteis, para elaboração dos Estatutos deste Instituto Público, o que inclui a localização da sede, está a decorrer até ao dia 28 de agosto.

É agora o momento de cerrar fileiras e exercer a magistratura de influência junto de quem decide… de cada partido político, com assento nesta Assembleia Municipal e não só, usar todas as formas de diplomacia junto das suas estruturas superiores!

E, mal seria que a Assembleia Municipal não se aliasse também na prossecução deste desiderato.

Esta decisão não depende do Governo, nem de nenhum Ministro, está nas mãos de alguém que foi eleito, também pelos membros desta Assembleia Municipal, em 13 de outubro de 2020 – o Sr. Presidente da CCDRN, distinto Professor António Cunha – cargo que será novamente sujeito a escrutínio eleitoral, nos termos previstos no já citado Decreto-Lei1 e, apesar deste procedimento, ter sido objeto de opiniões menos favoráveis aquando da sua realização, um processo eleitoral é sempre um processo eleitoral, com as suas virtudes e defeitos…!

Se, perante esta situação, nada fizermos, se baixarmos os braços, as gerações vindouras nunca nos perdoarão, tal como nós não devemos perdoar a quem, num passado de má memória, rejeitou liminarmente a possibilidade de instalação do Ensino Superior Agrícola na Escola de Carvalhais. Sr. Presidente, com o devido respeito permita sugerir uma visita ao edifício dos Serviços da Direção Regional de Agricultura na R. da República, acompanhado dos membros da Comissão Permanente… alguns nunca terão entrado lá e, por isso, desconhecem a dimensão e até a dignidade das instalações…

Poderá confirmar que temos espaço condigno para acolher a Presidência deste novo Instituto, como foram acolhidos, durante os últimos 45 anos, os diferentes Diretores Regionais de Agricultura.

E poderão também visitar a Quinta do Valongo (com cerca de 100 hectares de terra arável), património imóvel que, por força do disposto no art.º 6.º do já referido Decreto-Lei, será transferido para a CCDRN, incluindo os Edifícios Públicos lá existentes.

Fica a proposta!

E, por último, partilhamos um episódio da memória coletiva de Mirandela e do qual poucos dos presentes se recordarão – até porque muitos nem seriam nascidos ainda – mas fazendo questão que este registo fique em ata, para a posteridade…

Corria o ano de 1976, quando, num ato de rebelião popular ou desobediência civil (como prefiram), as forças vivas de Mirandela – comerciantes, industriais, empresários, agricultores, técnicos, operários e outros cidadãos – se mobilizaram e, com muita “firmeza”, invadiram as instalações da Direção Regional e retiveram o Diretor de então (Eng.º Teles Grilo), com o intuito de impedir que a sede da Direção Regional de Agricultura fosse deslocalizada para Vila Real. E, como sabemos, permaneceu em Mirandela até agora…!

Alguns dos protagonistas, felizmente, ainda se encontram entre nós e também o porta-voz desta intervenção, à data um jovem estudante na Escola Agrícola de Carvalhais, que vivia ainda com muita intensidade o sonho da Revolução, testemunhou e participou nesse episódio…

Aqui chegados, este é talvez o apelo mais forte e importante da nossa política local atual…!

Esta decisão de instalar a sede da CCDRN, IP em Mirandela – profundamente determinante para o futuro e desenvolvimento do Concelho e de toda a região – está agora a ser preparada… impõe-se por isso, uma mudança de paradigma na política partidária da região…!

O apelo é dirigido ao setor empresarial, associativo e cooperativo, aos autarcas, aos decisores e a todas as forças políticas, para que se concretize este reforço de coesão social, económica e territorial, cumprindo até uma Recomendação da Assembleia da República.

Aos decisores aponto as palavras do Professor Óscar Afonso, transmontano de Miranda do Douro, Diretor da prestigiada Faculdade de Economia: “(…) o centralismo pressiona a baixa produtividade do país (…). O país é muito centralista, o que significa que há custos de congestão pelo facto de estar tudo concentrado numa área metropolitana, sendo muito descurado o resto do país, onde as pessoas tendem a viver mal. (…) A população abandona essas áreas e não se aproveitam os recursos que existem, como é o caso da agricultura. (…)”

E também o próprio Professor António Cunha, atual Presidente da CCDRN, assim se pronuncia, em entrevista ao Público, em 18-03-2023: “A única coisa que o centralismo faz bem é descapacitar os territórios”.

Aos fazedores de opinião pede-se que leiam o Decreto-Lei antes de opinarem, até para se poderem pronunciar com conhecimento de causa, evitando interpretações enviesadas junto dos Mirandelenses que os ouvem, quanto ao que verdadeiramente se está a passar.

Desconhecendo, de momento, quais as estruturas partidárias distritais de toda a região norte que apoiam esta ideia, apenas podemos afirmar que o Grupo do Partido Socialista na Assembleia Municipal de Mirandela está disposto a lutar por esta causa até ao limite das forças…

E terminamos, fazendo nossas as palavras da Sr.ª Presidente, proferidas no passado dia 2 de junho:

«Por mais que me esforce, já não consigo entender porque insistem os decisores em concentrar tudo nos grandes centros, contrariando todos os princípios da Coesão Territorial… nem porque teimam em deslocar “Serviços” que suportam o frágil tecido social e económico do interior…

A meu ver, é o momento de estancar a hemorragia demográfica destas terras, e considero que estamos perante a grande oportunidade de, neste caso, o Governo mostrar ao país e ao mundo que está verdadeiramente empenhado na Coesão Territorial.»

Slider