Artigo de opinião escrito por Cristina Passas – Consultora
Nem sempre é confortável afrontar o que nos incomoda, por medo, falta de conhecimento e mesmo porque acreditamos que nada vamos conseguir alterar ou modificar.
E com este pensamento, ocorre-me uma narrativa que alguém que já não se entra entre nós depois de muita discussão à volta de um assunto complexo, encerrou o assunto com uma história que lhe transmitiram enquanto cadete:
“Um dia, quando um general por força da idade passou o testemunho, organizou a secretária e deixou os dossiers em cima da mesma para o seu sucessor. Mas, obviamente ainda com o sangue todo na guelra, o general indigitado depressa abriu todas as gavetas, e eis que encontrou um dossier lá bem no fundo da última gaveta. E claro está, questionou o seu antecessor se se tinha esquecido de o juntar aos outros dossiers… Respondendo o mesmo que não, obviamente que não! Que o mesmo já estava nessa mesma gaveta quando assumiu funções, tendo na altura a mesma idade que o general agora indigitado e que lhe foi dado o
conselho que há assuntos que o melhor mesmo é ficar como estão porque nada se pode fazer, conselho que recebeu e agora transmitia, aconselhando a deixar o dossier exatamente onde se encontrava”…
E eu, na altura ainda jovem, pensei: “Meu Deus, não pode ser assim…não podemos nos conformar desta forma”… mas a verdade é que de uma forma ou outra, por diversas razões e circunstâncias vamos aceitando que os dossiers fiquem pseudo-esquecidos na última gaveta, no entanto há limites!
E os limites que são regulados pela esfera do Direito, que só por si é tão vasto e complexo, que se atropela a ele mesmo nas suas várias ramificações, desde dos Direitos do domínio Público ao domínio Privado, não sendo exceção claro está o Direito do Urbanismo, e que nos empurra para outra realidade que também não deixa de ser verdade que são os próprios “tomadores” desse emaranhado de leis, decretos-leis, portarias, despachos e regulamentos, que muitas vezes em vez de simplificar os procedimentos e assim serem uns verdadeiros agentes públicos e promotores de dinâmicas que possam promover o desenvolvimento local, agem no alto das suas competências em sentido contrário aos objetivos que o Simplex da Administração Pública procura implementar face às necessidades da nova Era da Indústria 4.0.
Pois de pouco serve o Balcão do Empreendedor, plataforma digital de desmaterialização dos processos (para além da submissão e rastreabilidade dos processos) se objetivamente os que mais e melhor conhecem as malhadas do Urbanismo não se assumiram com agentes públicos, determinantes para atender e colaborar para que os processos sejam devidamente instruídos a montante, evitando perdas de tempo, custos das taxas e desalento dos empresários de tantas vezes que os processos dão entrada nos serviços, sem nunca “acertar com aquilo que afinal era pedido” porque o que se pede que só percetível a quem emite o despacho, ou serem sucessivamente pedidos mais e mais elementos ou esclarecimento, ficando diluído no tempo a
oportunidade de investimento e consecutivamente a criação de emprego.
O desenvolvimento local, nomeadamente nos territórios do Interior, nos chamados territórios de baixa densidade, carecem de iniciativas empresariais, mas carecem ainda mais de serviços públicos céleres, objetivos e adaptados às exigências que a Era Indústria 4.0 nos impõe, sob pena que no alto dos seus conhecimentos e poderes, e nas guerrilhas internas de dinastias instaladas, o mártir do jogo de poderes instalados seja o empresário e o município, com todos os prejuízos que isso acarreta para os empresários e todos os stakeholders diretamente e indiretamente associados à iniciativa empresarial, tais como colaboradores, fornecedores, etc, e
consequentemente para o território e para a sociedade. Urge contrariar os efeitos da “Teoria da Burocracia na Administração Pública” do sociólogo de MAX WEBER que embora seja uma obra do início do Século XX teima passado um século em estar tão atualizada!
Moral da história, de uma vez por todas, os dossiers devem sair da última gaveta dos generais porque devemos ter a ousadia de procurar contrariar o que para muitos se deve ir aceitando, porque com o conformismo o Mundo não avança e o tempo e o custo associado ao tempo e às oportunidades do empresário é de todo diferente do tempo a Administração Pública, basta dizer que o horário de labor da Administração Pública é das 9,00h às 17,30h e o do empresário é de Sol a Sol.
E em modo de conclusão, atrevo-me a dizer que no dia que os gigantes do urbanismo do chamado Território de Baixa Densidade de Lés a Lés “deste país á beira-mar plantado” decidirem aliar-se aos empreendedores o fosso entre o Interior e o Litoral poderá começar a ser uma miragem.